quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

as reformas estruturais, o progresso e a civilização

AS REFORMAS URBANAS: de 1870 à Rodrigues Alves e Pereira Passos

Discutimos no post anterior problemas de estrutura e saúde pelos quais passavam a cidade do Rio de Janeiro nos meados do século XIX. (E finalmente obtivemos respostas!!!) O encaminhamento deste é, a partir dos debates levantados pelo anterior, as grandes obras urbanas que mudam a “cara” do Rio de Janeiro. No entanto essas reformas serão repletas da idéia de civilização e progresso que permeava as mentes dos administradores-reformadores.



A cidade estava “atrasada”, ainda rodeada pelos seus ares e construções, ruas e costumes quase que coloniais. A Inspetoria Geral de Higiene (1886), que já havia mudado de nome inúmeras vezes, possuía, todavia, um objetivo claro: estabelecer reformas estruturais na cidade que pudessem livrá-la das doenças, de acordo, claro com as idéias de civilização e progresso. Um Rio de Janeiro civilizado não poderia mais conviver com o aparato colonial que desenhava a paisagem urbana. Um Rio de Janeiro que visava o progresso deveria ordenar os caminhos em prol do desenvolvimento da cidade. Essa concepção teve alvos objetivos: o Morro do Castelo, os cortiços e aglomerações populares e as ruas estreitas do Centro da cidade (para ser sucinto).

Já em 1870 começam algumas obras de saneamento e demolições de cortiços. Em 1893, o mais famoso cortiço da cidade, o Cabeça de Porco, seria posto abaixo. O Morro do Castelo só seria desmantelado em 1920, mas a derrubada de casas para a construção de largas avenidas já se iniciara nas últimas décadas do XIX e teria seu “ápice” na gestão do prefeito Pereira Passos em 1906, com Rodrigues Alves presidente da República.


Estas reformas são causadoras de dois importantes impactos na cidade do Rio. O primeiro, e óbvio, é a modificação de sua paisagem com a abertura de avenidas que propiciariam uma melhor circulação de pessoas e veículos. O segundo, não tão óbvio, mas socialmente grave, é a retirada da população que habitava o Centro. Para onde iriam os moradores dos cortiços e das casas derrubadas? Muitos acreditam que aí começa o processo de ocupação dos morros nos arredores do centro da cidade. É essa a proposta de discussão deste texto. O impacto das mudanças urbanas na vida da população pobre.


Para isso trazemos como auxílio algumas fontes. De início, uma reportagem do jornal “A República” datado da morte de Pereira Passos, no qual é possível perceber a idéia que a elite carioca tinha a respeito das habitações populares. O segundo é um resumo histórico da ocupação do Morro da Providência, disponível no site: http://www.favelatemmemória.com.br/. O terceiro (este está longo, eu sei, mas é legal!) é um trecho do livro “Cidade Febril” do historiador Sidney Chalhoub, narrando a demolição do Cabeça de Porco. Além de imagens, que podem ajudar, é claro! (nosso último post [comemorem!] é sobre a escravidão na cidade e a abolição).



[1] “A República”, 3 de março de 1913. “O Remodelador Da Nossa Cidade - O Seu Falecimento” disponível em http://www1.uol.com.br/rionosjornais/rj18.htm:

"(...) Aceitando o convite que lhe fôra feito pelo governo do Sr. Dr. Rodrigues Alves, o ilustre engenheiro Pereira Passos, para as altas funções de prefeito do Distrito Federal, o seu primeiro cuidado foi pedir carta franca para dirigir a cidade, pois profissional que era, tinha em mente planos de sua remodelação completa, absoluta. (...) E o Sr. Dr. Pereira Passos, sem mais detença, pôs em evidência o seu plano de remodelação da cidade, dando trabalho a milhares de operários, pondo abaixo pardieiros, prédios novos e velhos, mostrando que tudo que existia e estava de pé não prestava, era um atestado do nosso atraso, da nossa vergonha, de falta de capacidade administrativa e de pusilanimidade. Um trabalho ingente, foi um movimento como jamais se viu o que se fez durante a administração do grande engenheiro. O programa do Dr. Passos para sanear e embelezar a nossa hoje formosa cidade iniciou-se sob os melhores auspícios, tendo-se trabalhado com intensa afana na abertura de três avenidas, no alargamento de doze ruas, no prolongamento de outras três e de uma travessa e na canalização dos rios Carioca, Berquó, Banana Podre, Maracanã, Joana, Trapicheiros e Comprido".

[2] Avenida Central (atual Rio Branco) e o recém inaugurado Theatro Municipal, 1909:





[3]Destruição do Morro do Castelo:




[4] Morro do Castelo, ainda de pé:





[5] Resumo histórico da ocupação do Morro da Providência (ali, atrás da Central):

“Providência - batizado como Morro da Favela (Centro)

Considerada oficialmente a primeira favela do Rio de Janeiro, o Morro da Providência, que fica atrás da Central do Brasil, foi batizado no final do século XIX como Morro da Favela, daí também a origem do nome (substantivo) que se espalhou depois por outras comunidades carentes do Rio de Janeiro e do Brasil. Os primeiros moradores do Morro da Favela eram ex-combatentes da Guerra de Canudos e se fixaram no local por volta de 1897. Cerca de 10 mil soldados foram para o Rio com a promessa do Governo de ganhar casas na então capital federal. Como os entraves políticos e burocráticos atrasaram a construção dos alojamentos, os ex-combatentes passaram a ocupar provisoriamente as encostas do morro - e por lá acabaram ficando.”

[6] Morro da Providência:



[7] Trecho de “Cidade Febril” de Sidney Chalhoub:

“Era o dia 26 de janeiro de 1893, por volta das seis horas da tarde, quando muita gente começou a se aglomerar diante da estalagem (...) do Cabeça de Porco, o mais célebre cortiço carioca do período: (...) ornamentado com a figura de uma cabeça de porco (...) Há controvérsias quanto ao número de habitantes da estalagem: dizia-se que em tempos áureos, o conjunto havia sido ocupado por 4 mil pessoas; naquela noite de janeiro, com toda uma ala do cortiço interditada havia cerca de um ano pela Inspetoria Geral de Higiene, a Gazeta de Notícias calculava em quatrocentos o número de moradores. Outros jornais da época, afirmavam que 2 mil pessoas ainda habitavam o local. (...) Várias famílias se recusavam a sair, se retirando quando os escombros começavam a chover sobre suas cabeças. (...) muitos móveis não foram a tempo retirados e ficaram sob o entulho, O destino dos moradores despejados é ignorado, mas (...) O Prefeito Barata, num magnânimo rompante de generosidade, mandou “facultar à gente pobre que habitava aquele recinto a tirada das madeiras que podiam ser aproveitadas” em outras construções. De posse do material para erguer pelo menos casinhas precárias, alguns moradores devem ter subido o morro que existia lá mesmo por detrás da estalagem. (...) Poucos anos mais tarde, em 1897, foi justamente neste local que se foram estabelecer, com a autorização dos chefes militares, os soldados egressos da campanha de Canudos. O lugar passou então a ser chamado de “morro da Favela”. (...) nem bem se anunciava o fim da era dos cortiços, e a cidade do Rio já entrava no século das favelas. O que mais impressiona no episódio do Cabeça de Porco é sua torturante contemporaneidade”.

[8] Charge da “Revista Illustrada” sobre o “Cabeça de Porco”:

4 comentários:

  1. A vinda da Família Real para o Brasil significou a mudança para uma nova realidade, não somente para o país, mas principalmente para o Rio de Janeiro, a capital do Império.Como tratado no post anterior, o ambiente visto na cidade não condizia com uma imagem de modernização, progresso e civilização que uma cidade portadora do poder real deveria ter.
    A reforma urbana da cidade foi fomentada pela epidemia de febre amarela que se espalhou pela cidade. A estrutura da cidade ainda remontava o período colonial, marcada por uma habitação aglomerada e além disso com péssimas condições de higiene. Para tanto, a refoma urbana feita, e assim como as diretrizes do governo, regidos sob uma ordem, não levou em conta o aspecto social, prezando pela modernização e estruturação da sociedade em detrimento da camada mais pobre da sociedade que vivia nos cortiços. A demolição do Morro do Castelo evidenciou essa ideologia, em que foi desabrigada a população pobre que vivia ali, e não sendo posteriormente remanejados. O processo de urbanização da cidade, em suma, apesar de promover a modernização e melhora na infra-estrutura da cidade não levou em conta os aspectos sociais, evidenciando a ausência de políticas públicas na cidade por parte do governo.

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  2. Por ser a capital do Brasil, o Rio de Janeiro deveria ser um "exemplo" para as demais cidades, e o seria se fosse moderna (no caso, moderna significa "semelhante aos moldes europeus") e economicamente bem desenvolvida. Certamente uma epidemia - e o caos consequente - não seria uma boa coisa para a cidade, no âmbito da "aparência" mesmo (pois no de saúde pública, os efeitos negativos são óbvios).

    Independente de ser ou não uma boa medida, demolir cortiços para posteriormente remanejar a população (pobre) que neles viviam era uma forma de separar geograficamente os dois extremos da sociedade brasileira. Mesmo com a etapa do remanejamento suprimida, aumentou-se a separação entre ricos e pobres, pois os últimos passaram a ser segregados, então, em favelas.

    As ações contra a febre amarela que afetavam a elite não chegavam nem perto de absurdos como a remoção de inúmeros moradores de cortiços.

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  3. O caos urbano que o Rio se encontrava não podia continuar, sobre tudo sendo a capital do País. Cortiços, ruas estreitas, epidemias, mal cheiro e sujeira compunham a paisagem da cidade. A intenção do Estado na época era modernizar a cidade, trazer ela à contemporaneidade, e isso seria feito da maneira mais pratica: derrubando a moradia das classes mais pobres. Segundo o governo essas medidas resolveriam o problema. O que eles se esqueceram foi de onde colocar a população desalojada. Mais tarde essa população explusa do centro da cidade ocuparia as encostas dos morros dando inicio ao processo de favelização na cidade do Rio de Janeiro.

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  4. o Rio passava por um processo de urbanização e modernização. Aglomerações urbanas, cortiços, ruas estreitas...nada disso condizia com sua posição de atual capital do império. O governo encontrou então, como solução do problema, a demolição dos cortiços, do Morro do Castelo, deixando desalojada a população menos favorecida, ou seja, botou em prática as questões importantes à urbanização do Rio, esquecendo do aspecto social.Mais tarde, o povo foi levado para outros locais da cidade, sendo segregado da elite, iniciando assim um processo de favelização.

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